domingo, 13 de dezembro de 2015

"Ozimândias", de Percy Shelley.




Proponho aqui duas versões do famoso soneto inglês: uma em decassílabos e outra em dodecassílabos, salvo pela inscrição na estátua, que em ambas verti como um dístico à parte da estrutura geral do poema.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Poema para depois do Ano-novo


Tudo acabou sem nem sabermos como:
o que resta é um sabor amanhecido
na boca a anunciar o fim do pomo
e a amarga sensação do não ter sido.

Mas sei que, se cruzarmos nossas tardes
nalguma esquina ou bar, bem mais afins que
no passado, desviando o abrupto olhar

de espanto, o Amor dará dentro do peito
— o mais novo concerto de Stravinsky —

um grito de ódio a tudo o que é perfeito.



12 / 2015

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

"Lenora", de Poe.

(por Timothy Cole)

terça-feira, 13 de outubro de 2015

"Vitae Summa Brevis", de Ernest Dowson.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Placebo


Eu vou rimar rimando em rima rica,
Rimar rimando em rima rara eu vou,
Porque rimar em rima rara é pica,
Porque rimar em rima rica é show.

Queres compor? Eu já te dou a dica;
Queres compor? Amigo, te prepara:
Não rimes rima que não seja rica,
Não rimes rima que não seja rara.

Se for soneto, então, rima no embalo,
Pois não rimar é como não ter rima
E não ter rima é como não rimá-lo;

Mas lembra, meu amigo: ou rica, ou rara.
Adoça bem a péssima vindima
Que a falta de sabor não se repara.




09 / 2015

domingo, 13 de setembro de 2015

Um soneto escarrado.


É em noites assim que eu sinto um grande 
desejo de escrever o que não seja 
só palavra, capturar o que adeja 
no espaço oculto entre o que não se expande 
para além do papel e o sem-limite 
de ideais nascituros me encarando; 
mas se este anseio só me surge quando 
não dá para exceder nem mais um bit 
do que a mente suporta, e a coisa emperra, 
que me resta? Tão só fechar os olhos 
à batalha e conferir os espólios 
tendo dado por certo o fim da guerra 
(espólios tais previstos desde o início, 
num misto de catarse e lorem ipsum).



09 / 2015

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Três impressões do Tempo.

("Young Man with a Skull" - Frans Halls)

"And nothing 'gainst Time's scythe can make defence"
(Shakespeare, Sonnet XII)


sábado, 25 de julho de 2015

A uma poeta morta


não é porque não sabes meu nome
que não sabes quem sou:
cantas como ninguém meus malmequeres,
pintas como ninguém os meus ocasos.

tua Palavra
é como um flash-
-back, um sopro de vida
embolorado no vão do teto
                                           que salta à vista
quando procuro o céu.

é como se passasses discretamente com teu cigarro
e eu mal pudesse ver teu rosto,
mas logo sentisse o rastro de fumaça sufocante se alastrar,
o rastro dessa matéria sufocante
que me engole todo
de dentro para fora.



07 / 2015

terça-feira, 7 de julho de 2015

"Versos inscritos numa taça feita de crânio humano", de Byron.

sábado, 4 de julho de 2015

Um soneto de Edmund Spenser.



Do livro de sonetos Amoretti.

domingo, 28 de junho de 2015

Três rubaiyat de Omar Khayyam.



Publicados originalmente aqui.

Da trolldução + Soneto 116 de Shakespeare.



Trollduzir um poema é zoá-lo respeitosamente. Preserva-se a ideia geral, assim como a forma original. O que muda é a voz do sujeito, mais descontraído e com menos paciência para cortesia. É recriação; recreação.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

música popular


palavra incerta
corrente
que liberta

palavra estranha
montanha
não má escalada

palavra à toa
mestiça
flor-de-lis, boa

palavra minha
que em linha
não vale nada:

se canta ou grita
palavra, ide
seja bem dita

só leva multa
quem não transgride
a norma culta




06 / 2015

sábado, 6 de junho de 2015


Xepa: estrelas n'água —
mil pregões tentam vender
seus silêncios frescos.



06 / 2015

sexta-feira, 5 de junho de 2015

Boutique


Papai me diz que a Vida é coisa amarga
que arde a garganta e nunca mata a fome,
mas que é pra eu não chorar e beber tudo.

Engulo-a, e, por mais que a Vida arda,
meu papai – porque sou o filho homem –
não quer jamais que eu beba de canudo.



06 / 2015

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Eco


"Quem eu sou?", brada a voz como do fundo
de um poço; e então se alastra e se dissipa,
e se dissipa; e se dissesse qualquer outra
coisa – gritasse, esperneasse –, pouco
por fim viria à tona, à superfície
da piscina de medo em que me inundo.

"Eu sou?", responde a voz bem lá no fundo.



05 / 2015

"A Minha Mãe", de Poe.



Primeira tradução, dos altos de 2013. 

terça-feira, 28 de abril de 2015

Cinco poemas de William Blake.



Um de For the Sexes: The Gates of Paradise, dois de Songs of Innocence e outros dois dos manuscritos do poeta.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Ars Poetica

("The Corner of the Table" - Henri Fantin-Latour)


Vede, escrever sonetos não é difícil:
Lançai-vos mão de olhar atento, e basta.
O metro vos assusta? É arte gasta,
Menor dos males neste ousado ofício,

Pois tanto o artista a mesma pedra engasta
Que se acostuma; e, como nem mais visse o
Projeto, erige o décimo edifício
Dos cem que hospeda no interior da pasta.

Falai de amores, dores e de musas,
Do quanto a morte é bela, e a vida, inglória;
Palavras? Escolhei as mais confusas;

A rima? Seja rara; o fecho? Escore-a;
E eis o soneto: as pompas vêm inclusas!

Mas, vede, poesia é outra história.



03 / 2015

terça-feira, 14 de abril de 2015

"Pássaro Azul", de Bukowski.


Charles Bukowski dispensa apresentações: todo e qualquer jovenzinho descolado que se preze já leu pelo menos um poema de sua lavra e se fascinou com os palavrões, as putas e o alto teor alcoólico naqueles versos.

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Biographia Literaria


Conto dezenove
com cara de trinta.
Dois anos na estrada.

No bolso direito, carteira vazia;
no esquerdo, um pedaço de alma
surrado, mofado
que levo de mimo.

Nos olhos,
o chão que enraízo
nas lentes,
o céu que desprezo
entre eles,
o beco onde residem as ideias brutas.


Trago o melhor da Poesia Crássica
Ultrarromanca
feito um monge cuja mão, trêmula da idade,
não acompanha o pensamento
e se deixa levar por intempéries do desejo.


Alguém leu meus versinhos de angústia
e julgou por bem dizer: "esse é poeta!"
(mas se soubessem dos sorrisos que escondo atrás das dores,
certamente não me chamariam poeta.)



04 / 2015

terça-feira, 7 de abril de 2015

Testamento

(detalhe de "Up in The Studio" - Andrew Wyeth)

Quando eu vier a morrer
(e pode ser qualquer dia),
não quero horror no processo,
quero tampouco alegria;

não quero a vida passando
por meus olhos como um filme;
que ali meu drama se encerre,
e a trama guarde quem viu-me

quando o meu riso era fácil,
quando o meu choro, contente;
fiquem com a parte da história
em que o poeta ainda sente.

Quando eu vier a morrer
(e pode ser amanhã),
quero ouvir o silêncio
sobreposto à prece vã;

e, vindo a dor, que eu padeça,
não chore a perda, no entanto:
se a vida não vale a pena,
a morte não vale o pranto.

Quando eu vier a morrer
(pode ser hoje, quem sabe),
que o mundo aprenda comigo
e se conforme, e se acabe;

que eu sinta o sopro da noite,
que eu sinta a brisa da aurora
uma vez mais, com desdém,
para - impassivo - ir embora.

Querem saber? Morro agora
e disso não me arrependo;
se perguntarem por mim,
digam que morri vivendo.



04 / 2015

Descrença

("Christ on the Cross" - Peter Paul Rubens)


O pecador, defronte à imagem sacra
do Cristo redentor, defronte à Virgem,
fitando o chão (que o céu lhe dá vertigem),
desanda o choro em voz penosa e fraca.

Diz ele: "Ó céus, bem sei como hei pecado,
como estas mãos pusera em mau caminho;
perdoai-me, ó Pai; e, ó Mãe, pousai em mim
o vosso pio olhar! Eis o meu fado:

fazei o que quiserdes dele!" E erguidos
os braços numa cruz imaginária,
procura as mãos de Deus, procura ouvir
do santo a doce voz — mas vê o altar,

e a sacra imagem crava-lhe uma densa
feição de angústia e de total descrença.




04 / 2015

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Versos inscritos em um tronco tombado

A Manoel de Barros.

Não sou rapaz de fitar o infinito
e caçar humanismos nas estrelas:
só contemplo o céu noturno para vestir pequenez.


Às almas tortas falta olhar o chão.
Nada é tão interessante quanto o cio das borboletas.


Um escarro vale mais que um cometa:
o filho do homem cuspiu na terra e fez brotar visão.
Mais que asas de cera,
a humanidade carece de olhos de barro.


Nisso de ouvir o céu eu não me encaixo.
Deus para mim
só no andar de baixo.


Viver como vive o inseto à vista alheia
momentos antes de abraçar a morte:
nem seu último espasmo verte despedida.


Dar à vida o charme de um sonho erótico
do qual se desperta
sem nenhuma recordação.



02 / 2015

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Sonetos 14 e 17 de Shakespeare.


Estamos na luta.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Hai, mas não cai


rio de meus problemas
frágeis pedras no implacável
rio de meus poemas.



01 / 2015

domingo, 25 de janeiro de 2015

Três verbetes rejeitados

1. Humanidade:
enorme espelho estilhaçado
cuja natureza primária é distorcer o objeto real
seja lá qual for; ou

dicionário de uma só palavra
e incontáveis (in)definições.

2. Poeta:
estilhaço menor
manchado de terra
e cansado de refletir senão a terra; ou

interjeição profana
banida pelos bons costumes.

3. Poesia:
música gerada no baque de uma pedra
sobre o espelho sujo de mundanices; ou

gemido que se produz no momento
entre a pergunta
e a ausência de resposta.



01 / 2015

sábado, 17 de janeiro de 2015

Autonegação


Eu canto o Amor, embora não me iluda
nisso de amar o quanto me cative:
se a lira é doce ou por demais felpuda,
em direção contrária o peito rema.

Mentindo é que o poeta sobrevive.
[o que talvez inclua este poema]



01 / 2015

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Era um poema de amor
desses que surgem do acaso,
como batom no concreto.

Como se deu esse beijo,
por que se deu logo ali?
Eu lhe pergunto, e silêncio.

Talvez nem ele saiba
[só resta a marca do beijo,
a marca: nem falo ou vulva,
nem lábios importam mais]

e tão somente espere
o decair do futuro,
para esquecer o poema,
para esquecer que foi muro.



01/2015

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Sonho

("The Prisoner" - Nikolai Yaroshenko)


Olho-te o corpo nu como um tesouro aberto,
E olhas por mim, como um Satã sereno —
Acordo! Esvai-se o sonho, e encontro-me desperto
Buscando o teu veneno...

As mãos procuram tudo à escuridão da noite
E nada encontram, salvo a própria sombra.
Tão logo vais embora, açoite após açoite,
O mundo se me escombra...

O peito, em choque, abraça a solidão do quarto.
A madrugada em derredor se aviva
E rompe os meus vitrais como um terrível parto
E escorre igual saliva...

E lembro-me de ti, do sonho inalcançado
Que contemplei como o poeta à lua:
O olhar lascivo, o sangue em gozo embalsamado,
A carne exposta e crua...

Decido pôr em verso o teu retrato ausente:
Mordaz, a pena as emoções me arranca
E esboça um vil sorriso, escrito amargamente
Na folha escura e branca.

Busco uma vela; acendo-a. A luz, covarde e fria,
Em nada se compara à flama que és.
Apago-a de uma vez: bem mais me aqueceria
Prostrasse-me aos teus pés...

Escuto a negritude a me cantar, calada,
Tua lembrança em melodias quérulas;
Decido, então, caçar essa ilusão finada
Como quem caça pérolas...

Retomo da ilusão reminiscência pouca:
Nem teu perfume eu pude mais sentir;
Sequer minh'alma à tua, a minha à tua boca
Eu pude mais unir...

Tão só, na infinda noite, o peito se consome,
E range o crânio dentro da cabeça;
Me atiro à treva, e, louco, a murmurar teu nome,
Imploro que amanheça!...

E, quando, finalmente, ao sono me condeno
E toda a angústia julgo enclausurada, enfim,
Vejo-te nua, aos céus, como um Satã sereno,
Pousando o olhar em mim...



01 / 2015