Uma nova palavra
germina entre os escombros,
e sem que se vislumbre
seu destino de verbo,
um murmúrio montante,
caule tenaz, arguto,
triunfa sobre a estática
daninha do discurso
como uma espera rouca.
Um pássaro de sangue
aurora o céu da boca.
A mudez pavimenta
o solo; todavia,
embrião de ruínas,
é nela que se lavra
a tal palavra-muda,
e é justamente dela
que reclama seu signo
antissonante, alheio
à melífera fanfarra
da língua que se amouca.
Um pássaro de sangue
aurora o céu da boca.
Convém gestá-la, embora
tardia às tantas vozes
há tanto soterradas,
e embora as débeis fibras
que restem, por receio,
custem a articular
seu máximo esplendor,
e embora, muito embora
a noite seja muita
para alvorada pouca.
Um pássaro de sangue
aurora o céu da boca.