quinta-feira, 2 de julho de 2020

Outro soneto de Olavo Bilac para o inglês!


Há quanto tempo não postava uma tradução aqui!

Não é a primeira vez que tento lançar o Bilac para a gringa: há alguns anos, esbocei uma tradução de seu famoso "Língua Portuguesa", perdida nos confins deste bloguinho. Como forma de exercício e também de combater o bloqueio criativo, arranhei agora uma versão inglesa de seu soneto "Milton Cego", presente em Tarde. Dedico-o ao amigo e tradutor Rubens Chinali Canarim, da Contemporary Brazilian Poetry, com quem tenho aprendido muito.
A proposta foi traduzir o verso alexandrino de Bilac mantendo a quantidade de sílabas. Não me ative à disposição dos pés: relendo a tradução com calma, percebo estar atado à dicção do português mesmo quando escrevo em inglês. Um falante nativo, familiarizado com iambos e anapestos, pode perceber e estranhar esse filho bastardo de duas línguas. Se o poema chegar a ele, dou-me por satisfeito. Vale também apontar que "optei" por traduzir o soneto, originalmente petrarquiano, como um soneto inglês, "diálogo intencional" com a tradição poética  da língua de Milton. Não foi em absoluto por dificuldades em manter as mesmas rimas em dois quartetos. Boa leitura.






MILTON CEGO

Desvendava-se ao cego o mistério: (As idades
Sem princípio; de sol a sol, de terra a terra,
A eterna combustão que maravilha e aterra,
Geradora de bens e de ferocidades;


Cordilheiras de espanto e esplendor, serra a serra,
De infinito a infinito; asas em tempestades,
Tronos, Dominações, Virtudes, Potestades,
Luz contra luz, furor de chama e glória em guerra;


E os rebeldes, rodando em rugidoras vagas;
E o Éden, e a tentação, e, entre o opróbrio e a alegria,
O amor florindo ao pé da amaldiçoada porta;


E o Homem em susto, o céu em ira, o inferno em pragas;
E, imperturbável, Deus, na sua glória!...) Ardia
O poema universal numa retina morta.


MILTON BLINDED 

Para Rubens Chinali

The mystery unveiled to the blind: (The times
Beginningless; from sun to sun, from land to land,
The perennial combustion that doth awe and shend,
Maker of good as well as of ferocious crimes;

Ridges that daze and dazzle, hill to hill, all o'er,
Infinity to infinity; wings storming in,
Authorities, Dominions, Virtues, Ophannin,
Clashing of light, fury of fire, glory at war;

And the rebels revolving, roaring surges steaming;
And Eden, and the first temptation, and in bloom
Amid disgrace and mirth, love at the gates of doom;
The fright of Man, the wrath of Heaven, Hell blaspheming,

And, stolid, God, in all His glory!...) There would blaze
The universal poem in a lifeless gaze.