quarta-feira, 26 de junho de 2019

Capital


um pássaro
sabiá-laranjeira ou bem-te-vi
urubu ou carcará
desponta no vazio entre as colunas
da rua margeada de edifícios
capitéis de uma cúpula invisível
num rasante
sem término ou início
e costura
sobre as bocas cerradas
um horizonte possível

domingo, 16 de junho de 2019

Lemons in the sky, ou Leminski na gringa

 
Foto de Márcio Santos.


Instigado por uma amiga a traduzir para o inglês o seguinte poema de Leminski, posto aqui o resultado, que muito me agradou. Por razões óbvias, foi preciso trocar o nome da moça, e minha tradução se tornou como que uma versão libérrima do original. Mas acredito que o Paulo o entenderia melhor do que ninguém.


Ali

ali

ali
se

se alice
ali se visse
quanto alice viu
e não disse

se ali
ali se dissesse
quanta palavra
veio e não desce

ali
bem ali
dentro da alice
só alice
com alice
ali se parece


There
(Paulo Leminski, trad. Pedro Mohallem)

Para a Alice.

there is
one
there is
a

if theresa
knew there is a
lot in what theresa says
there isn't

and if
there is a word
which comes and goes
better unheard

there
right there
inside theresa
only theresa
reminds theresa
there is a her

domingo, 2 de junho de 2019

Canção para a queda


. A carne calou-se
; a pétala rósea
da língua secou
; as unhas outrora
tão limpas (trincadas
embora) e tão doce
seu áspero toque
à guisa de foice
rompendo as auroras
e o hímen da noite
; são faca teimosa
talhando-me a coisa
mais tua, Senhora –
o que não é corpo
tendão ou memória
o que é sem o todo
: o giro da roda
a sede do fogo

. A carne calou-se
carpida nas horas –
não chores, Senhor
: cantemos agora