terça-feira, 28 de abril de 2015

Cinco poemas de William Blake.



Um de For the Sexes: The Gates of Paradise, dois de Songs of Innocence e outros dois dos manuscritos do poeta.

Considerações:

I. Busquei manter a equivalência silábica, transpondo cada verso com o mesmo número de sílabas do original;

II. Adaptações ao português foram aplicadas sem medo de ser feliz, como é o caso dos nomes Kate e Nan no primeiro poema, traduzidos Caim e Bento, de maior (alguma) carga semântica em nossa língua; e

III. Quando impossível preservar a imagem literal, recorri a paráfrases, como em 'To Nobodaddy': a imagem da serpente astuta foi sacrificada e cobriu-se a perda com a imagem de um papai do céu monopolizador de conhecimento.


***

TO THE ACCUSER WHO IS THE GOD OF THIS WORLD


Truly, My Satan, thou art but a Dunce,
And dost not know the Garment from the Man.
Every Harlot was a Virgin once,
Nor canst thou ever change Kate into Nan.

Tho' thou art Worship'd by the Names Divine
Of Jesus & Jehovah, thou art still
The Son of Morn in weary Night's decline,
The lost Traveller's Dream under the Hill.



AO ACUSADOR QUE É O DEUS DESTE MUNDO


És tão somente um tolo, ó meu Satã,
Que do homem não discernes o indumento.
Foi casta, um dia, toda cortesã,
E não podes tomar Caim por Bento.

Embora assumas a expressão divina
De Cristo e Jeová, não és senão
O sonho de um viajor sob a colina,
A Estrela da Manhã na cerração.



SONGS OF INNOCENCE


INTRODUCTION


Piping down the valleys wild,
Piping songs of pleasant glee,
On a cloud I saw a child,
And he laughing said to me:

‘Pipe a song about a Lamb!’
So I piped with merry chear.
'Piper, pipe that song again;'
So I piped: he wept to hear.

‘Drop thy pipe, thy happy pipe,
Sing thy songs of happy chear.’
So I sung the same again
While he wept with joy to hear.

‘Piper, sit thee down and write
In a book, that all may read.’
So he vanished from my sight,
And I plucked a hollow reed,

And I made a rural pen,
And I stained the water clear,
And I wrote my happy songs
Every child may joy to hear.



INTRODUÇÃO


Trauteando vale adentro
Sons de cândida alegria,
Vi nas nuvens um pequeno,
E ele, rindo, me dizia:

'Toca um hino do Cordeiro!'
Com prazer, toquei-o, então.
'Outra vez, flautista!' E ei-lo
A chorar de comoção.

'Deixa a flauta, a alegre flauta,
Canta os hinos de alegria.'
Outra vez, então, cantei-lhe,
Que, a chorar, feliz me ouvia.

'Senta, pois, flautista, e escreve
Em um livro o que tu cantas.'
Esvaiu-se à vista, e, em breve,
Apanhei porções de cana.

E, uma pena improvisando,
E, a água límpida a tingir,
Eu compus alegres hinos
Para o pequenino ouvir.


THE SHEPHERD 


How sweet is the shepherd's sweet lot!
From the morn to the evening he strays;
He shall follow his sheep all the day,
And his tongue shall be filled with praise.

For he hears the lambs' innocent call,
And he hears the ewes' tender reply;
He is watchful while they are in peace,
For they know when their shepherd is nigh.



O PASTOR 


Como é doce a lida do Pastor!
Da aurora ao crepúsculo vagueia;
Segue seu rebanho todo o dia,
De Hosanas a boca leva cheia.

Porque ouve o chamado do cordeiro,
E assiste à ovelhinha que responde;
Vive alerta, e eles em paz, porquanto
Sabem que o Pastor não está longe.



BLAKE'S MS. BOOK


TO NOBODADDY


Why art thou silent & invisible,
Father of Jealousy?
Why dost thou hide thyself in clouds
From every searching Eye?

Why darkness & obscurity
In all thy words & laws
That none dare eat the fruit but from
The wily serpent's jaws?
Or is it because Secresy
Gains females' loud applause?



AO PAPAI-NINGUÉM


Por que tão quieto & jamais visto,
Ó Pai de toda Inveja?
Por que Te ocultas entre as nuvens
De quem Te ver deseja?

Por que tão turvas tuas leis
& tudo o que proferes:
P'ra que a comer ninguém se atreva
Do fruto que preferes?
— Ou é que Discrição garante
O aplauso das mulheres?



MOTTO TO THE SONGS OF INNOCENCE
& OF EXPERIENCE


The Good are attracted by Men’s perceptions
And think not for themselves,
Till Experience teaches them to catch
And to Cage the Fairies & Elves.

And then the Knave begins to snarl,
And the Hypocrite to howl,
And all his good Friends show their private ends,
And the Eagle is known from the Owl.



EPÍGRAFE ÀS CANÇÕES DE INOCÊNCIA 
& DE EXPERIÊNCIA 


As mãos dos Bons a alheios raciocínios
São fortemente atadas,
'Té que a Ciência ensine-os a caçar
E enjaular seu elfos & fadas.

E vê-se, então, que rosne o esperto
E vê-se o hipócrita que ruja
E o bom amigo olhar o próprio umbigo
E a Águia avultar-se da Coruja.



04 / 2015